Numa cidade de
pássaros e frutas certa vez foi construída uma praça: local sempre procurado
pelos casais, onde as crianças brincam e gritam e onde nascem lindas flores. Um
local criado para ser belo e colorido, onde as pessoas iam, vinham e riam.
Mas as cidades
são pedaços de coisas maiores. E, quando as coisas são grandes, nem sempre
sabemos o porque delas serem como são... Chegaram os tempos de guerra e tudo
ficou diferente. A praça então passou a ser palco de um espetáculo de horror,
onde a crueldade humana podia ser diariamente assistida. Por isso, da praça
agora se corria. Todo mundo queria ir para casa. Mas não era todo mundo que
conseguia...
Vitória era uma
mulher simples que gostava muito de flores e árvores. Tinha saído de um lugar
pequeno para viver na cidade e ouviu dizer antes de ir que a praça era a melhor
parte, pois lembrava a beleza do seu interior.
Vitória chegou empolgada,
mesmo sem conhecer ninguém, mas acabou chegando em época de guerra e deparou-se
com ameaças de violência em plena praça. “Isso não tem nada a ver com meu
interior”, pensou. Mas ela havia saído de lá justamente porque queria uma
experiência nova; conhecer pessoas, contribuir com a cidade, aprender novidades
e desenvolver suas velhas habilidades. Resolveu ficar por ali e buscar
sobreviver em meio a tudo aquilo que agora fazia parte da sua realidade.
Descobriu, por
causa dessa persistência, que os dias não eram todos iguais... as pessoas
também não agiam todas iguais... e que, superando todas as intempéries do
ambiente, as flores continuavam nascendo e crescendo na praça... As
pequenininhas, as maiores, as claras, as escuras... Em meio às árvores, que
também resistiam bravamente aos tiros que levavam...
Mas isso
começou a mudar, pois a praça começou a ficar doente. Murchando, secando, sem
dar bons frutos. Então Vitória passou a freqüentar a praça com assiduidade,
apesar dos pesares, a praça continuava sendo uma praça: local onde se nasciam
as flores da cidade. Vitória se arriscava, e além disso via coisas
desagradáveis nesse caminho: corpos ensangüentados, gritos de dor, choros
desesperados. Sofrimentos de seres humanos provocados por outros seres
desumanizados.
E o que ela ia
fazer lá na praça? Obviamente, cuidar da terra, regar as plantas, proteger as
árvores. Todo mundo havia se afastado de lá, a natureza estava abandonada. Alguém
precisava ter esse cuidado... Certa vez uma pessoa, de dentro de uma janela,
que sempre via quando ela passava, perguntou a Vitória por que ela se arriscava
e suportava tudo isso por nada. E Vitória disse que, se a pessoa fosse lá com
ela, ela mostrava.
A pessoa não
quis ir ver, estava muito amedrontada, mas Vitória ficou com a pergunta em sua
mente e ao chegar na praça respondeu sozinha: “Por nada???? Se ela visse com
meus olhos, ela veria que as flores que antes murchavam agora estão perfumando
meu caminho... que as árvores que haviam secado agora estão cheias de folhas,
me doando ar puro e abrandando o calor dos meus dias... que os bichos que
haviam perdido bruscamente suas casas agora tiveram de volta um lar, um
ninho... e, por isso, ganhei muitos amigos...”
E a cada planta
e árvore que floria na terra, fertilizada com carinho por Vitória, a cidade
ficava menos cinza. O choro até continuava, mas a vida teve Vitória na praça...
Camila Sousa de
Almeida