Os Contadores de Histórias da
América Nativa são os guardiães de nossa história e de nossas Sagradas
Tradições. Cabe a eles conservar vivos os nossos antigos conhecimentos para
assegurar a futura expansão que nossos filhos trarão à Terra. Os Contadores de
Histórias viajavam entre os grupos e as Tribos das diversas Nações, levando as
notícias dos acontecimentos que afetavam a todos os Nativos. O Contador de
Histórias costumava contar os fatos que aconteciam em outros acampamentos, ao
redor da fogueira comunitária, depois do jantar. O Contador de Histórias falava
de atos heróicos, da Contagem de Golpes sobre algum inimigo, de um Sonho de
Cura que profetizasse futuros acontecimentos, de Histórias de Sabedoria que
conservavam viva a Tradição ou, ainda, trazia as últimas notícias acerca de
nascimentos e de mortes nas Tribos.
Os Índios das Planícies
costumavam chamar seus Contadores de Histórias de Cabelos Trançados. Esses
Contadores de Histórias usavam uma pequena mecha com tranças e nós, que lhes
caía pelo meio da testa e que os caracterizava como professores e historiadores
da Tribo. Um Cabelo Trançado do sexo masculino não precisava participar das
batalhas, mas deveria observar tudo e recordar-se mais tarde, passo a passo, do
desenrolar da luta. Já um cabelo trançado do sexo feminino era a historiadora que
mantinha viva a tradição feminina e que deveria ensinar as mulheres mais jovens
a sentir orgulho de seus respectivos papéis dentro da Tribo.
Os Contadores de Histórias de
todas as Tribos e Nações constroem uma ponte entre os ensinamentos tradicionais
e o momento presente. As crianças de todas as gerações aprendem as lições
tradicionais que Os Contadores de Histórias ensinam e aplicam estas Histórias
de Sabedoria às suas próprias vidas. Também os pais e avós costumavam contas as
Histórias de Sabedoria para as suas crianças, todas as noites, na hora de
colocá-las debaixo dos mantos de Búfalo para dormir. Mas isto não produzia o
mesmo efeito que a chegada do Contador de Histórias da Nação, que visitava as
Tribos regularmente para contar suas histórias às crianças.
As Histórias de Sabedoria
costumavam ser contadas e recontadas ano após ano para que os Ensinamentos do
Povo permaneçam vivos. Cada história possui diversos significados e
relaciona-se de formas diferentes à vida de cada pessoa. A cada vez que uma
história é repetida, cresce o nível de entendimento, de acordo com o
amadurecimento das pessoas que estão escutando. Os mesmos acontecimentos dentro
de uma história também podem ser repetidos inúmeras vezes, de maneira
diferente, para que cada ouvinte possa perceber de que modo aquela história se
adapta melhor ao seu próprio momento de vida.
O modo de pensar do Povo Vermelho
difere bastante do modo de pensar dos outros povos. Nós não costumamos revelar
qual é a verdadeira mensagem contida em nossas Histórias de Sabedoria.
Preferimos deixar que as pessoas utilizem os seus dons individuais de intuição
e observação para perceber o significado real dessas histórias. Assim, os
ensinamentos da Raça Vermelha são transmitidos de forma que cada um possa
aprender conforme o seu próprio ritmo e seu próprio modo de ser, dando
liberdade a que cada pessoa aplique ou não estes ensinamentos à sua vida.
Os Contadores de Histórias
aprendiam a respeitar a liberdade de pensamento de todos aqueles que iam em
busca de sua Sabedoria. Desta maneira as crianças aprendiam a valorizar a própria
inteligência e sentiam que eram membros respeitados de sua Tribo. O Contador de
Histórias considerava cada criança como uma pessoa igual a ele, e colocava-se
no mesmo nível dela. Se as crianças agissem de forma tola ou começassem a
perturbar o grupo, eram simplesmente ignoradas, e fingia-se que elas nem mesmo
estavam ali presentes. A falta de reconhecimento e de atenção logo punha fim ao
mau comportamento. O Contador de Histórias conseguia passar dias seguidos
fingindo que não via nem ouvia determinada criança. Esta forma de disciplina
era muito mais eficiente do que o castigo corporal porque a criança se sentia
envergonhada diante das outras crianças também.
A memória ocupa um lugar especial
em nossa Tradição Nativa Americana. Como as nossas histórias são transmitidas
oralmente, a lembrança é cultivada como uma arte. Cada uma das ervas, plantas
ou flores empregadas no processo de cura deve ser lembrada para as futuras
gerações. Cada dança, Cerimônia, ritual, iniciação e ensinamento precisa ser
guardado na memória. Todas as Leis e profecias tribais devem ser repassadas
intactas para as futuras gerações. Os Golpes e as perdas precisam ser
recordados para que se possam armar futuras estratégias. É claro que uma única
pessoa não poderia recordar-se sozinha de todas essas coisas, ou tornar-se uma
especialista em todos esses assuntos. É por isso que os diversos Clãs possuíam
historiadores que guardavam a história oral de uma determinada área de
conhecimento em sua memória. Estes fragmentos dos Ensinamentos Tribais eram
repassados para a própria geração e cada pessoa recordava-se de um fragmento
que fazia parte dos aspectos gerais da cultura nativa.
O Contador de Histórias da Tribo
tinha um posto no Conselho de Anciões. Sendo um historiador, o Contador de
Histórias era convocado a contar os fatos passados com total precisão para que
estes acontecimentos ajudassem a solucionar os presentes problemas. Os Cabelos
Trançados ensinavam a forma de viver de maneira equilibrada através das ações
dos personagens das Histórias de Sabedoria. Uma História de Sabedoria, contada
de maneira adequada, podia acabar com as discussões, mudar o curso de uma vida,
insuflar novo ânimo em épocas difíceis ou ainda encorajar os jovens a assumir
novas responsabilidades na vida.
O Contador de Histórias possuía o
dom de contar Histórias de Sabedoria nas quais as pessoas agiam levadas pelo
medo ou pela ignorância, sem, no entanto, referir-se a alguma pessoa em
particular. Assim, os ouvintes se tornavam capazes de chegar às suas próprias
conclusões. Todos os Sábios Nativos preferem ensinar por meio de histórias a apontar
diretamente os defeitos de alguém. Em nossos Ensinamentos sempre nos recordam
que, quando apontamos o dedo acusando alguém, três outros dedos estarão
apontados contra nós. Por outro lado, o Contador de Histórias consegue, com sua
técnica, indicar delicadamente os pontos em que estamos errados, permitindo-nos
corrigir nosso comportamento, sem ter que passarmos vergonha na frente dos
companheiros. Esta é uma forma didática de permitir que cada pessoa decida como
aplicar as histórias ouvidas em sua própria vida.
Trecho retirado do livro “As Cartas do Caminho Sagrado – A Descoberta
do Ser Através dos Ensinamentos dos Índios Norte-Americanos”, de Jamie Sams.
Imagino quanta sabedoria tinham esses contadores!!
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